14-09-2011 19:33

 

Respondendo a uma pergunta do PÚBLICO sobre a crise que já se abateu sobre a Grécia, Irlanda e Portugal e que ameaça estender-se a Itália, afirmou Tettamanzi: “A União Europeia deve ser verdadeiramente uma união, não privilegiar alguns mas saber olhar para todos, sobretudo para as situações dos mais pobres", afirmou, em declarações a jornalistas, depois de intervir no Encontro Nacional da Pastoral Social, da Igreja Católica.

Defendendo uma “Europa solidária”, o cardeal, que em Milão criou um Fundo Família Trabalho para apoiar situações de famílias sem emprego, admitiu que hoje prevalecem “egoísmos” nacionais. Os nacionalismos que regressaram ao discurso europeu exigem “passos em frente no que respeita à solidariedade”. O ponto de vista humano, “de valores mais profundos” deve prevalecer sobre a economia, defendeu, quando se trata de atacar a actual crise do sistema financeiro.

Já na sua conferência, o cardeal afirmara que na origem da actual crise económica está “o uso liberal da finança, que se abateu rapidamente sobre a economia e que gerou muito depressa um dramático aumento do desemprego a nível global”.

A actual crise “é sobretudo uma crise de valores”, acrescentou, para sublinhar: “É sobretudo a manifestação de quanto as pessoas esquecem o que é verdadeiramente o homem, o primado da pessoa sobre o capital, do bem comum face ao lucro de poucos.”

O cardeal italiano afirmou esperar que os mais responsáveis socialmente – “administradores públicos, empresários, gestores" – continuem "a procurar insistentemente modos de aumentar a oferta de emprego”. A crise, disse, “atingiu gravemente os mais fracos, ou seja, os menos responsáveis por esta situação”. E reflecte uma “atitude de anti-solidariedade difusa e escondida como um verdadeiro vírus social, contagioso e difícil de diagnosticar”.

Sobre o papel da Igreja Católica, o cardeal Tettamanzi disse que esta “pode ser uma força educativa”, no âmbito dos problemas económicos, financeiros e do desenvolvimento das nações.

É necessária uma “renovação total” das “grandes instituições económicas”, acrescentou o cardeal, repetindo uma afirmação do Papa Bento XVI na encíclica Caritas in Veritate, publicada há dois anos. E o actual processo de globalização trouxe a percepção de que as pessoas se encontram “à mercê de um movimento imparável, que traz consigo insegurança, precariedade, instabilidade, em todos os sectores da vida”.

O ex-arcebispo de Milão acrescentou que “a globalização deve ser assumida como uma solidariedade verdadeira”. A situação “exige uma renovação total, que revolucione o comportamento de todos”, que pode chegar à necessidade de “voltar a formas de economia menos avançadas, mais circunscritas”. “Os direitos dos fracos não são fracos direitos”, disse ainda.

O Fundo Família Trabalho, criado no Natal de 2008 pelo cardeal Dionigi Tettamanzi na diocese de Milão, recolheu já mais de 12,5 milhões de euros e apoiou mais de 6300 famílias, cujos membros ficaram sem emprego. Seiscentos voluntários foram mobilizados para trabalhar com as famílias atingidas pelo desemprego.

O fundo pretendia ser um “gesto concreto de ajuda aos núcleos familiares em situação de necessidade” e também um “impulso para compreender que, face a situações como estas, é preciso repensar radicalmente as próprias escolhas de vida”, disse o cardeal, insistindo na ideia da sobriedade.

Esta iniciativa da diocese de Milão inspirou a criação do Fundo Social Solidário, instituído há um ano pela Conferência Episcopal Portuguesa e que já apoiou três mil famílias.

O Encontro Nacional de Pastoral Social, sobre o tema “Desenvolvimento local, caridade global”, termina esta quinta-feira com a discussão de um documento de orientações para a acção social das paróquias.

Fonte: www.publico.pt/Sociedade/cardeal-italiano-pede-em-fatima-mais-uniao-europeia-contra-a-crise_1511958